Em Abaetetuba, município paraense, a Cachaça Indiazinha resgata a tradição cachaceira da região norte do país, valorizando ingredientes típicos da Amazônia, como jambu, açaí e guaraná
“Os alambiques são lindos”, pensou Omilton enquanto assistia a uma reportagem televisiva, exibida em 2014, sobre a produção de cachaça no sul do Brasil. Esse foi o lampejo que fez o paraense, Omilton Quaresma, decidir, no outro extremo do país, lançar sua própria destilaria de cachaça. “Eu entrei rápido no computador, consultei valores de alambiques na internet e liguei para o meu sócio”. No ano seguinte, surgia a Cachaçaria Indiazinha. As informações são do Mapa da Cachaça.
Filho de ribeirinho que chegou à faculdade, o engenheiro químico, formado pela Universidade Federal do Pará, só conhecia os processos de destilação na teoria. “Nunca tinha visto um alambique em funcionamento, mas sabia que queria empreender”, conta.
Omilton, que é membro da Comunidade Belém Negócios, – e a Cachaça Indiazinha – vêm de Abaetetuba, município há 130 quilômetros da capital Belém. A cidade da região amazônica já foi conhecida, no século 19, por sua intensa produção de cachaça com cana de várzea, planícies inundáveis invadidas por enchentes sazonais. A fama entrou em declínio a partir da década de 1970, com a abertura da Rodovia Belém-Brasília, que saturou o norte com produtos industrializados de outras partes do país.
“A produção era tão intensa que há relatos de que Abaetetuba chegou a produzir 5 milhões de litros e ter 70 alambiques registrados”, relata. Evidência dessa reputação são os ramalhetes de cana de açúcar que aparecem no brasão oficial da cidade. Detalhe que Omilton descreve com o orgulho de um produtor da nova geração, que trabalha para resgatar a história e a cultura da cachaça de alambique no Pará, a partir dos sabores locais que distinguem a região amazônica.
Cachaça Indiazinha: jambu, açaí e guaraná
A Destilaria de Cachaça da Amazônia, dona da marca Indiazinha, é uma das principais produtoras de destilados do país que levam jambu, açaí e guaraná. “Gostamos de dizer que criamos o estilo amazônico de bebidas”. As aguardentes compostas são o carro chefe da marca, que tem ainda no portfólio versões de cachaça branca e com passagem em amburana e também carvalho.
O açaí e o guaraná já têm espaço garantido no coração dos brasileiros, por isso é com a bebida alcoólica mista de cachaça de alambique e jambu, que a Indiazinha deseja se popularizar – e popularizar a cachaça nortista. “Nosso propósito é levar a Cachaça Indaiazinha, com esse forte apelo amazônico para todo o Brasil e para o mundo”.
O jambu é uma hortaliça muito utilizada na culinária norte do Brasil, principalmente no Pará, em pratos famosos como o tacacá e o pato no tucupi, que vem ganhando destaque. Essa erva típica da região possui o espilantol, uma substância anestesiante, usada pelos povos indígenas e, que nos últimos anos tem sido pesquisada, difundida e aplicada em diferentes produtos, de alimentos à fármacos. Ele é famoso pela dormência e sensação de tremelique que causa na boca quando entra em contato com a pele.
Indiazinha Jambu: um segredo amazônico
Mas a região cachaceira mais densa da Amazônia ainda mantém alguns de seus encantos bem protegidos. A receita da bebida mista Indiazinha Jambu é segredo industrial. O que se divulga é que a bebida não passa por armazenamento. Depois de elaborada com extrato de jambu é logo engarrafada. Omilton conta apenas que a aguardente composta não é feita por infusão.
O jambu é altamente perecível e, a exemplo da cana de açúcar, precisa ser usado em até 48 horas. Para equalizar os diferentes tempos produtivos, do jambu e da cana, Omilton e os sócios desenvolveram uma rota para estabilizar o insumo e garantir provisão da erva o ano inteiro. “Nosso estoque tem jambu com mais de um ano de armazenamento”.
A empresa mantém parceria com agricultores familiares locais para o fornecimento do jambu, mantendo o controle da cadeia produtiva. A Destilaria Amazônia chegou a plantar o próprio jambu, mas percebeu que poderia auxiliar no desenvolvimento sustentado da região formando parcerias. “Começamos a homologar esses produtores familiares como nossos fornecedores e, hoje, somos o maior cliente deles”, diz Omilton.
Cachaça e produção sustentável
A sustentabilidade também é aplicada na parte social com contratação dos colaboradores: cerca de 80% das pessoas que trabalham na Destilaria Amazônia são vizinhas da propriedade. A Cachaça Indiazinha é produzida na parte continental de Abaetetuba e a cana de açúcar é plantada na propriedade seguindo um rigoroso processo. “A nossa indústria nasceu com cuidado ambiental na outorga para captação da água, na destinação correta do vinhoto e do excedente de bagaço de cana”.
Depois de alguns testes com cana caiana e varietais comerciais, os produtores da Indiazinha encontraram uma planta que se adaptou bem às condições climáticas locais, tipicamente úmida e quente, com chuvas abundantes o ano todo. O corte é manual e a fermentação da cachaça é natural.
“Cheguei a ouvir que na Amazônia não tinha cachaça, porque aqui não dava para produzir cana de açúcar”, Omilton Quaresma
O sucesso no canavial da Destilaria da Amazônia é um exemplo de como o senso comum pode ser um mito. Em 2023, a Cachaça Indiazinha vendeu 400 mil garrafas de 750ml, dados divulgados pelo produtor. Desse montante, 40% foram para o Pará, maior consumidor do produto, e outros 20% para São Paulo. O restante teve distribuição diluída pelo país.
Voltando a produção, Omilton explica que a janela de colheita da cana de açúcar na região amazônica é mais curta, tendo apenas quatro meses. Entre agosto e dezembro, com a diminuição das chuvas, o sol predomina. É quando a cana amadurece e os produtores aproveitam para a colheita e produção de cachaça. “Por aqui brincamos que existem somente duas estações: um período que chove e outro que chove muito”
O produtor confirma que a produtividade da cana é afetada por essas condições climáticas. Algo em torno de 10%, na comparação a outros produtores do país, segundo Omilton. Por outro lado, esse clima equatorial exerce forte influência no produto final. É o terroir amazônico, ele afirma:
As condições climáticas da região amazônica fazem com que a Cachaça Indiazinha branca seja menos adocicada. Um doce menos enjoativo, mas em comparação, o aroma é muito mais floral. Omilton Quaresma
Pode estar aí a explicação para esse casamento perfeito da Cachaça Indiazinha com os outros sabores amazônicos.
Mapa da Cachaça
Leia Mais:
Descubra um novo jeito de fazer network e desenvolver novas habilidades com a Comunidade Belém Negócios
Acompanhe todas as notícias do Belém Negócios sobre a COP-30, acesse a Central da COP-30
Belém Negócios lança iniciativa Oficina de Negócios, um ambiente para preparar as empresas para a COP-30
Comments