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De tijolos à próteses humanas; conheça 6 produtos inusitados feitos a partir do açaí

Pesquisadores da Amazônia lideram experimentos que ajudam a proteger o meio ambiente ao reaproveitarem o caroço do fruto de forma sustentável


Acai
O plástico à base de açaí se "biodegrada" em 150 dias - Polimex/Divulgação

Antes de mais nada, um aviso importante! Este conteúdo não necessariamente vai dar destaque aos produtos já conhecidos do mercado e que já fazem sucesso no Brasil e no mundo, como o saboroso sorvete de açaí, os cremes, biscoitos, geleias e cachaças que usam o nosso fruto da Amazônia como matéria-prima, mas sim, falaremos de ideias que ganharam formato a partir de experimentos de pesquisadores preocupados com o meio ambiente através de um melhor aproveitamento do alimento de forma sustentável; Curioso? Então vamos lá!


Conheça 6 curiosidades feitas a partir do açaí


1. CAROÇO DE AÇAÍ VIRA PLÁSTICO BIODEGRADÁVEL


Estudantes do curso superior em Processos Químicos do Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ) se juntaram, em 2018, para fundar uma startup capaz de oferecer tecnologias que substituíssem o plástico petroquímico – responsável por grande parte da poluição dos oceanos e outros ecossistemas – por uma uma solução que de fato é sustentável. Foi assim que nasceu a Polimex Bioplásticos, que produz plásticos 100% biodegradáveis, a partir de resíduos agroindustriais, o principal deles, o caroço do açaí.


“Nós reaproveitamos o caroço de açaí e outros resíduos agroindustriais, que em sua maioria vai parar em aterros, na produção do PNB – Plástico Natural Niodegradável, principal produto da empresa atualmente. Esse material biocompósito pode ser aplicado em diversas indústrias, como na indústria de transformação de descartáveis de plásticos de uso único, ou como embalagens para indústrias de alimentos e cosméticos”, afirma Paulo Cardoso, CEO da Polimex.


Após descartado, o plástico desenvolvido pela startup se biodegrada no ambiente natural ou em composteiras caseiras e industriais, em cerca de 150 dias, virando adubo orgânico, sem gerar qualquer tipo de resíduo tóxico ao meio ambiente ou microplástico.


2. FIBRAS DO FRUTO PODEM VIRAR EMBALAGENS




Na Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), no Pará, estuda-se o uso do caroço do açaí para substituir a madeira na geração de energia limpa e bioprodutos. A pesquisa foi coordenada pela professora Lina Bufalino, que é paulista e tem experiências anteriores com a criação de bioprodutos a partir de fibras de bagaço de cana de açúcar e de milho, dentre outros. “A fibra é uma célula que a gente tem na planta que é muito resistente, não degrada fácil, tem longa duração. E a gente reparou que tudo que era fibroso poderia ter usos que substituíssem a madeira. Se a gente faz MDF com a fibra de madeira, por que não fazer com a fibra de outros materiais?”, contextualiza.


O papel de açaí já é uma realidade no mercado paraense. Veja reportagem aqui.


“Quando eu notei esse resíduo, a primeira coisa que reparei foi a quantidade de fibras, aqueles ‘cabelinhos’ em volta do caroço de açaí”, recorda Lina. O aspecto chamou atenção porque toda fibra tem grande potencial para gerar bioprodutos. “Tem potencial de fazer, a partir dessa fibra, carvão, MDF, papel e outros bioprodutos”, complementa.



3. CAROÇO DO AÇAÍ PODE VIRAR RAÇÃO


No Amazonas, pesquisadores do IFAM alimentaram porcos com ração feita a partir do caroço do açaí - Foto: Idalécio Pacífico

No Sul do Amazonas, estado com a segunda maior extração de açaí do Brasil, foi testado o uso do caroço do açaí para alimentar porcos. Divulgada em 2020, a pesquisa contou com uma equipe multidisciplinar do Instituto Federal do Amazonas (IFAM) e da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), das áreas de medicina veterinária, agronomia, zootecnia e técnico em agropecuária. O projeto foi coordenado pelo médico veterinário Idalécio Pacífico e realizado no município de Lábrea, no Amazonas. “É uma região que produz açaí e que, ao mesmo tempo, tem uma carência muito grande de alimentação animal, porque os insumos vêm de outros estados e chegam com alto custo, especialmente no período chuvoso. Os agricultores familiares, sem conseguirem comprar esses alimentos, especialmente o milho e a soja, já davam de vez em quando o caroço do açaí puro com um pouco de sal para os porcos”, situa o veterinário.


Sobras da cana de açúcar e do açaí são usados por pesquisadores para produzir energia elétrica. Aqui, a reportagem completa.


Desse modo, os pesquisadores decidiram testar rações com diferentes níveis de inclusão do caroço de açaí em suas composições. Depois do período de tratamento, avaliaram que não havia diferenças significativas em comparação aos suínos que se alimentaram com ração tradicional.


Após comprovar o potencial  do caroço de açaí para compor rações alternativas para suínos, o projeto foi finalizado. Mas, segundo Idalécio Pacífico, tem potencial para ser continuado, investigando se há fatores que podem colaborar negativamente na absorção de vitaminas e minerais dos suínos e testando a alimentação em outros animais, como aves.


4. PÓ E AZEITE DE AÇAÍ


Raul Junior e equipe da UFPA desenvolveram tecnologia capaz de extrair pó e azeite  da polpa do açaí - Foto: Igor Mota

A Universidade Federal do Pará (UFPA), um grupo de pesquisa coordenado pelo engenheiro químico Raul Carvalho Júnior, desenvolveu a “tecnologia supercrítica” para extrair o pó e o óleo do açaí. O objetivo inicial era solucionar um problema comum de paraenses que viajam para fora do estado: obter açaí de qualidade em qualquer lugar, sem que o alimento precise ser congelado para transporte e comercialização, preservando as características do fruto tão importantes para o paladar paraense.


Preservar a madeira com um óleo extraído a partir do açaí foi um dos experimentos de pesquisadores das Universidades do Acre e Bahia.


“A ideia era separar o pó e o óleo do açaí, fazendo com que os compostos bioativos do fruto, que são altamente oxidativos, não sofressem degradação com facilidade na presença da luz solar e em altas temperaturas. Obtendo o pó e o azeite separados, imaginamos que esses produtos pudessem ser comercializados separadamente. Depois que a pessoa comprasse e levasse para casa, ela poderia misturar os dois componentes junto com água, e assim, obter açaí em qualquer lugar”, relata.


Os resultados da pesquisa superaram as expectativas do grupo, que percebeu diversas outras aplicações dos subprodutos. “O óleo do açaí é como um azeite vegetal, com mais propriedades funcionais, que pode ser consumido na nossa dieta diária, inibindo antioxidantes do corpo, proporcionando ômega 3, vitamina E, vitamina A. O pó do açaí também é riquíssimo em proteínas, minerais e composto bioativo antioxidante, como a antocianina, que podem ser usados na indústria de alimentos e de cosméticos, além da área medicinal. Mas essa área ainda requer alguns estudos”, detalha Raul.


Com as descobertas, Raul acredita poder ampliar o mercado paraense: “O açaí ainda é comercializado hoje de forma muito rudimentar, exploratória e extrativista, sem grandes benefícios para as comunidades ribeirinhas, que plantam, de fato. Isso acontece porque vendem o açaí simplesmente para tomar, a única qualificação é se ele é fino ou grosso, se está azedo ou não. Com essa tecnologia, o Pará teria a oportunidade de comercializar um novo produto beneficiado, podendo negociar direto com as indústrias, o que agrega valor a toda a cadeia de produção”, cogita o pesquisador.


5. CONCRETO E PRÓTESE ÓSSEA DE AÇAÍ


Tijolo feito com caroço de açaí é desenvolvido por jovem empreendedora no Pará

Essas sementes, que já eram reaproveitadas com a fabricação artesanal, vêm ganhando cada vez mais novas finalidades, a partir de estudos feitos por empresas com apoio de instituições de ensino superior.


Geisiane Ferreira Ribeiro do Nascimento, de 29 anos, teve uma ideia que chamou a atenção: a produção de tijolos a partir dos caroços de açaí, visando criar uma solução sustentável de descarte.  A ideia foi apresentada na primeira Feira de Negócios Sustentáveis do Xingu, promovida pela empresa Norte Energia, em Altamira (PA), com o objetivo de criar soluções possíveis para o problema que persistente na região. A criação foi por meio da Xingu Tijolos Sustentáveis, cujos clientes são floriculturas, pessoas físicas e futuramente empresas do setor da construção civil. 



O objetivo de Geisiane é buscar a produção ambientalmente consciente, visando a redução de emissões de CO² (já que os tijolos sustentáveis não necessitam de forno), a diminuição de resíduos na obra e a redução de custos em até 40%, além de proporcionar um padrão estético atrativo.


“O TIJOLO PASSA POR UM PROCESSO DE SECAGEM POR ALGUNS DIAS, E DEPOIS ELE É TRITURADO. APÓS A TRITURAÇÃO É FEITA UMA MISTURA, QUE É COLOCADA EM UMA MÁQUINA ONDE É FEITO O PROCESSO DE COMPRESSÃO. TODOS ESSES TIJOLOS SÃO COMPACTADOS PARA QUE ELE TENHA UMA RESISTÊNCIA MELHOR. DEPOIS DE MAIS ALGUNS DIAS DE SECAGEM ELE JÁ ESTÁ PRONTO


6. FABRICAÇÃO DE PRÓTESES


por ser rígida e porosa, espuma facilita o crescimento ósseo

Um estudo realizado, em 2012, por pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA) e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em São Paulo, descobriram que a fibra do caroço do açaí pode ser usada na fabricação de próteses para o corpo humano. Durante o processo, as sementes são colocadas em um equipamento, onde são trituradas até virar um pó, que nada mais é que o poliol. Em seguida, os cientistas transformam o composto em poliuretano, essa é a substância à criação das próteses.


Segundo o estudo, um dos principais benefícios de uma prótese de base natural, como é o caso da prótese de açaí, é a redução do número de cirurgias que os pacientes teriam que passar. A pesquisa valoriza o reaproveitamento de caroços de açaí que seriam descartados nos lixões da capital,  transformando a semente em matéria-prima com valor comercial às pessoas que as necessitam, melhorando sua qualidade de vida.


Mais sobre o açaí...


feira do açaí, Belém-PA

No Pará, os caroços de açaí são abundantes, uma vez que a fruta é popular, mas apenas 4% deles são aproveitados. A falta de aproveitamento causa problemas de acúmulo de resíduos, prejudicando o meio ambiente.


Um relatório da ONU de 2021 destaca que o plástico representa 85% dos resíduos que chegam aos oceanos e adverte que até 2040, os volumes de plástico que fluem para o mar quase que triplicarão, com uma quantidade anual entre 23 e 37 milhões de toneladas.

Isto significa cerca de 50 kg de plástico por metro de costa em todo o mundo. Estudos em parceria com a consultoria Mckinsey, já alertaram que se nada for feito, em 2050 haverá mais plástico do que peixes nos oceanos.


Ver o peso, Belém-PA

O açaí está presente na maioria das mesas da população que vive na região Norte do país. Na Região Metropolitana de Belém (RMB), estima-se que mais de 500 mil litros de açaí são consumidos por dia. Após a polpa da fruta nativa da floresta amazônica ser extraída, o caroço do fruto quase sempre é descartado e, em alguns locais, o descarte do resíduo se torna um problema ambiental. Na capital paraense existem cerca de 10 mil pontos de vendas de açaí. Em alguns desses lugares são descartados aproximadamente 15 sacas de caroço por dia. No final de semana a quantidade dobra e a produção em toda a cidade passa de 500 toneladas por mês, segundo levantamento feito pela UFPA.

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